A Câmara dos Deputados e o Senado Federal escolheram, neste sábado (1º), seus novos presidentes para os pelos próximos dois anos. Também foram escolhidos os ocupantes dos demais cargos das mesas diretoras.
A votação foi mera formalidade: o deputado Hugo Motta (Republicanos-PB) e o senador Davi Alcolumbre (União-AP), apoiados pelos atuais presidentes de ambas as casas, eram francos favoritos para serem eleitos sem dificuldades.
Enquanto isso, o todo-poderoso Arthur Lira (PP-AL) e o fiel da balança Rodrigo Pacheco (PSD-MG) se preparam para voltar ao “chão de fábrica” do Congresso e aguardam um convite do presidente Lula (PT) para integrar o governo.
Câmara e Senado: o passo-a-passo da votação
- Câmara: Eleição do presidente e 10 cargos da Mesa Diretora. São necessários 257 votos para vencer no primeiro turno. Votação secreta
- Senado: Escolha do presidente e 10 membros da Mesa. Vitória no primeiro turno exige 41 votos.
Os favoritos construíram alianças que vão do PT ao PL, garantindo ampla vantagem. Na Câmara, houve o recorde estabelecido por Lira na disputa de 2023: 464 votos dos 513 possíveis. O resultado garantiu ainda mais poder ao alagoano, que não hesitou em demonstrar sua força para emparedar o governo.
Já no Senado, Pacheco recebeu 49 dos 81 votos em sua reeleição. Na corrida de dois anos atrás, o PL lançou Rogério Marinho (RN) e conquistou 32 votos, mas ficou sem qualquer cargo relevante no comando da Casa. A sigla de Jair Bolsonaro resolveu não insistir no erro e se aliou rapidamente a Alcolumbre.
Oposição tenta marcar posição
Na Câmara, o PSOL, com Pastor Henrique Vieira (RJ), e o Novo, com Marcel van Hattem (RS), apresentaram candidaturas próprias para marcar posição.
No Senado, três postulantes ligados à extrema-direita também se lançaram: Marcos Pontes (PL-SP) — sem o apoio formal de seu partido —, Marcos do Val (Podemos-ES) e Eduardo Girão (Novo-CE). Não possuem chances de vencer, mas defendem bandeiras caras ao bolsonarismo, como a ofensiva contra o Supremo Tribunal Federal.
O que pode mudar para Lula na Câmara?
As vitórias de Motta e Alcolumbre mantém o chamado ‘Centrão’ no controle do Congresso. Para Lula, isso significa uma relação previsível com o Senado, mas a manutenção de incertezas na Câmara.
Arthur Lira— que vestiu literalmente a camisa de Bolsonaro em 2022 — segue pressionando o governo por mais poder e emendas. O Planalto conseguiu aprovar projetos importantes, como o arcabouço fiscal, a reforma tributária e o pacote de corte de gastos, mas o custo para Lula, tanto político quanto fiscal (via emendas), foi alto.
Motta tende a adotar um tom mais moderado, sem abrir mão da influência do Centrão. Paulo Henrique Cassimiro, doutor em Ciência Política e professor da UERJ, descreve o deputado como um presidente da Câmara de perfil “clássico”, à semelhança de Lira e de seu antecessor, Rodrigo Maia: grande capacidade de articulação interna, mas baixa popularidade fora do Congresso.
Para Cassimiro, o fator decisivo na relação da nova cúpula da Câmara com o governo será a possibilidade de o Centrão lançar um candidato — ou mais de um — à Presidência em 2026. Essa equação inclui o União Brasil, que pode apostar em Ronaldo Caiado, o Republicanos, principal avalista de Tarcísio de Freitas, e o PSD, onde desponta Ratinho Junior. Esses três partidos, contudo, já ocupam ministérios.
O cientista político não enxerga interesse do Centrão em tensionar sua relação com Lula antes de 2026, ainda que pretenda lançar um nome da direita contra o petista. “A dois anos da eleição, aproximar-se da extrema-direita teria um custo político alto. Para quê?”.
Cláudio Couto, cientista político da FGV-EAESP, também destaca a capacidade de articulação de Motta, mas aponta incertezas sobre sua postura como presidente da Câmara.
“Imagino que ele será mais moderado na relação com o Executivo do que foi Lira, que adotou uma postura excessivamente agressiva, de chantagem mesmo, colocando a faca no pescoço”, diz Couto. “Acho pouco provável que ele seja tão ou mais agressivo do que Lira”.
E no Senado?
A extrema-direita vê no Senado uma peça-chave para 2026, especialmente no objetivo de viabilizar o impeachment de ministros do STF. Bolsonaro quer ampliar sua bancada a partir de 2027 e já testa os limites de sua influência.
A anistia aos golpistas do 8 de Janeiro segue na pauta do bolsonarismo, e o ex-presidente não esconde sua estratégia. “Estamos negociando a primeira-vice-presidência. Em uma ausência do Alcolumbre, dá para colocar a anistia em votação. Não queremos esperar um futuro presidente de direita ser eleito em 2026”, disse Bolsonaro em 24 de janeiro.
Pacheco, que retaliou o PL por não apoiar sua reeleição em 2023, ignorou a proposta de anistia. O partido de Bolsonaro agora aposta que Alcolumbre será mais receptivo, embora ele também seja aliado do mineiro.
Para Cláudio Couto, a chance de a anistia avançar com Alcolumbre é maior do que era com Pacheco, mas ainda incerta.
“Vimos o que aconteceu no 8 de Janeiro, vemos o Supremo atuando. Será que Alcolumbre vai querer confrontar o STF?”, questiona. “A possibilidade é um pouco maior, mas ainda longe de garantir a aprovação desse projeto.”
Além disso, as descobertas da Polícia Federal sobre a trama golpista de 2022, incluindo planos de sequestro e até assassinato de autoridades, tornaram o ambiente ainda mais hostil para a proposta bolsonarista, ressalta o cientista político.
2026 e o xadrez ministerial
A eleição no Congresso ocorre em meio a negociações para uma reforma ministerial. Gleisi Hoffmann (PT) deve assumir a Secretaria-Geral da Presidência, em um movimento mais voltado ao PT do que ao Centrão.
Lula enfrenta dilemas: ampliar o espaço de partidos infiéis nas votações, como União Brasil, Republicanos, PP e PSD, ou redistribuir forças? Vale a pena levar Pacheco para o Executivo e fortalecê-lo em Minas Gerais? E Lira, deixá-lo na Câmara ou dar-lhe um ministério?
Além de não garantirem apoio consistente, esses partidos podem ser adversários em 2026. O presidente do PSD, Gilberto Kassab, já afirmou que o PT perderia se a eleição fosse hoje. Lula ironizou: “A eleição é só daqui a dois anos”. No dia seguinte, Marcos Pereira (Republicanos) cravou que o governo “está sem rumo”.
Com a proximidade de 2026, o preço do apoio partidário sobe — e não só no Centrão. O PSB já dá sinais de insatisfação. Nesse cenário de ebulição política e disputas por emendas, Lula tenta reverter a queda na popularidade em 2025 e chegar revigorado para 2026.
Com informações da Carta Capital