fevereiro 24, 2025 13:19

TJBA aposenta juiz que fez edital apenas para LGBTQIAPN+

O juiz Mário Soares Caymmi Gomes busca mudar no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) a decisão do Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA) que determinou sua aposentadoria compulsória. A medida, aplicada em 29 de janeiro, foi resultado do processo administrativo disciplinar (PAD) aberto contra o magistrado em 2023.

O tribunal apontou “violações ao dever de urbanidade e à conduta irrepreensível esperada de um juiz”. No entanto, Mário e entidades ligadas à causa LGBTQIAPN+ alegam que a decisão foi motivada por discriminação, devido a um edital lançado por Mário para a contratação de estagiários da comunidade. O julgamento, ocorrido no Dia da Visibilidade Trans, gerou críticas de organizações defensoras dos direitos LGBTQIAPN+, que destacaram os esforços de Mário para promover a inclusão.

O pedido de liminar para suspender a aposentadoria foi negado pelo conselheiro Caputo Bastos, relator do caso no CNJ. Ele argumentou que a interferência do órgão em processos disciplinares só ocorre em situações excepcionais, o que, segundo ele, não se aplica ao caso. Agora, o juiz aguarda o julgamento do plenário do CNJ, sua última possibilidade de reverter a decisão.

Quem é Mário Gomes?

Mário Soares Caymmi Gomes se tornou magistrado em 1996, aos 24 anos, e consolidou-se como ativista da causa LGBTQIAPN+, presidindo a comissão do TJ-BA. Ele era titular da 27ª Vara de Substituições de Salvador até ser afastado preventivamente em setembro de 2023.

O conflito com o tribunal começou em janeiro daquele ano, quando Mário abriu um edital para o preenchimento de três vagas de estágio destinadas exclusivamente a pessoas LGBTQIAPN+. “É um direito meu dizer quem eu quero para esse estágio. Todos os juízes têm direito, e eram três vagas para a política afirmativa, de um total de 1.700 do tribunal”, defendeu o magistrado.

A medida gerou controvérsia e foi anulada pelo então corregedor-geral de Justiça, José Edivaldo Rocha Rotondano, sob o argumento de que o edital discriminava a população heterossexual e poderia não atrair candidatos suficientes.

Entrevista motivou punição

Enquanto aguardava o julgamento de seu recurso pelo CNJ, Mário participou de um programa de rádio da Assembleia Legislativa da Bahia, em maio de 2023, para discutir a empregabilidade da população LGBTQIAPN+. Durante a entrevista, criticou a decisão do corregedor e fez uma declaração que foi determinante para sua punição.

“O que me causou maior incômodo é que essa determinação tenha vindo de um corregedor que é gay, ainda que ele não se assuma. […] Já que estamos tratando desse tema relevante, e isso não é fofoca, eu acho que isso tem a ver com o caso: sei que ele é gay porque ele teve um caso com o meu marido, antes dele [meu marido] me conhecer”, disse.

Pouco mais de um mês depois, em junho, o CNJ rejeitou o recurso de Mário. Dias depois, o presidente do TJ-BA, Nilson Castelo Branco, apresentou uma representação disciplinar contra o magistrado, dando início ao PAD que resultou em sua aposentadoria compulsória.

Em setembro de 2023, o TJ-BA publicou um decreto estabelecendo cota de 5% das vagas de estágio para pessoas trans. Para Mário, a medida teve o objetivo de ofuscar sua iniciativa: “Ou seja: eu que não podia fazer a ação porque o presidente é quem queria ser louvado por isso. Eles querem tirar o meu protagonismo. É importante frisar que depois de um ano nenhuma pessoa trans foi contratada. Ou seja, fizeram um ato para alegarem diversidade, mas que não fazem questão alguma de cumprir”, criticou.

Argumentos da defesa e do tribunal

Nos autos, divulgados pelo portal UOL, desembargadores enfatizaram que a declaração dada à rádio exigia uma punição severa. Alguns, porém, mencionaram o uso de linguagem inadequada em decisões judiciais proferidas em 2022. Segundo Mário, as pessoas supostamente ofendidas nunca procuraram a Corregedoria.

Na sessão inicial do julgamento, em dezembro de 2024, a relatora sugeriu aplicar apenas uma pena de censura, mas o entendimento foi contestado por outros desembargadores, que defenderam a aposentadoria compulsória. Eles alegaram que a conduta do magistrado desrespeitava o tribunal e comprometia a imagem da instituição.

Sobre as declarações na rádio, Mário argumentou que não caberia ao TJ-BA puni-lo, pois se tratava de um comentário pessoal. “Se eu expus uma pessoa a algum constrangimento, essa pessoa física deve tomar as providências para responsabilizar –e esse senhor entrou com ação penal por difamação contra mim. Uma coisa é a pessoa física, outra é o tribunal pegar isso para si e fazer um ‘justiçamento’ em resposta a uma suposta revelação indesejada”, pontuou.

O Terra entrou em contato com o Tribunal de Justiça da Bahia, mas não obteve retorno até a publicação desta reportagem. Caso o TJ-BA se posicione sobre o caso, a matéria será atualizada.

 

 

Com informações do Portal Terra

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