O Ministério Público Federal (MPF) instaurou inquérito civil para apurar possíveis irregularidades no uso indiscriminado de medicamentos sem eficácia comprovada, como a hidroxicloroquina, no tratamento contra covid-19 em comunidades indígenas do Amazonas.
Segundo publicação do Diário Oficial do Ministério Público Federal, desta sexta-feira, 21, o Governo Federal e o Ministério da Saúde teriam incentivado a promoção de ações de estímulo ao uso de medicamentos com eficácia não comprovada contra a Covid-19, notadamente a substância hidroxicloroquina, a título de “tratamento precoce” ou “kit Covid”.
Conforme documento assinado pelo promotor Fernando Merloto Soave, o governo teria encaminhado lotes da hidroxicloroquina para as aldeias Yanomami para tratamento da Covid-19, mesmo diante de pesquisas que comprovaram a ineficácia do medicamento.
A portaria Nº 8, de 14 de maio de 2021, ainda faz menção a estudos que apontam que a hidroxicloroquina pode inibir o SARS-CoV-2, vírus causador da COVID- 19, in vitro, ou seja, estudos feitos em laboratório, não em seres humanos. E até o presente momento, não há evidências científicas de que o medicamento seja eficaz e seguro na prevenção ou tratamento de pacientes com a doença.
Além disso, no dia 17 de junho de 2020, a Organização Mundial da Saúde (OMS) anunciou que o braço de hidroxicloroquina do Estudo Solidarity, que busca encontrar um tratamento eficaz para Covid-19 foi interrompido, baseado em evidências. No estudo A living Who guideline on drugs to prevent covid-19, publicado em 2 de março deste ano, 32 pesquisadores vinculados à Organização Mundial de Saúde e pertencentes a instituições de ensino e pesquisa do mundo inteiro concluíram a ineficácia do uso do referido medicamento no tratamento contra Covid-19 e alertaram para os efeitos colaterais decorrentes de tal aplicação.
Considerando as evidências científicas e observações de profissionais da saúde que apontam para o incremento do risco de morte causado pelo uso dos medicamentos indicados no “kit covid”, defendido por Bolsonaro, e que a distribuição de hidroxicloroquina nas aldeias indígenas é um dos objetos de investigação da CPI da Pandemia – instalada pelo Senado Federal em abril deste ano para investigar possíveis irregularidades na gestão da pandemia – o promotor estabelece um prazo de 15 dias para que o Distrito Sanitário Especial Indígena (DSEI) envie cópias dos relatórios da gestão farmacêutica de 2020 e 2021.
Além disso, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (Foirn) e outras associações representativas dos povos indígenas do Amazonas terão que apresentar, em um prazo de 30 dias, informações sobre possíveis relatos e casos de uso de cloroquina e medicamentos do “kit covid” em comunidades indígenas do Amazonas por prescrição ou fornecimento dos DSEIs.
Confira o documento:
Yasmim Araújo, para O Poder
Foto: Agência Pará