O plenário da Câmara dos Deputados decidiu nesta quarta-feira, 10, rejeitar a cassação do mandato parlamentar de Carla Zambelli (PL-SP).
Foram 227 votos a favor, 170 contrários e 10 abstenções – seriam necessários 257 votos para a cassação.
A cassação seria uma consequência da condenação da deputada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) por ter comandado uma invasão a sistemas do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). A sentença, de 10 anos de prisão, se tornou definitiva e sem possibilidade de recurso em junho.
Na decisão, o STF determinou a perda de mandato, o que deveria ocorrer de forma automática. No entanto, a Câmara contrariou essa decisão ao rejeitar o pedido de cassação da deputada.
Além disso, no caso de condenações criminais, quando não são mais passíveis de recurso (como as de Zambelli), ocorre a suspensão dos direitos políticos. Assim, a pessoa fica sem a possibilidade de votar ou de se candidatar a cargo eletivo enquanto durar a pena.
A decisão dos deputados cria um impasse que envolve a interpretação da Constituição. Por isso, o tema pode voltar a ser discutido pelo STF.
Os deputados entenderam que a deputada poderia permanecer no cargo. A situação se assemelha à ocorrida com o ex-deputado federal Natan Donadon, em 2013, que foi condenado pelo STF mas teve o mandato preservado pelos colegas da Câmara.
O resultado contrariou a recomendação da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), que aprovou por 32 votos a 2 a recomendação de perda do mandato.
Condenação por invasão de sistemas do CNJ
Zambelli foi punida em dois processos penais na Corte. Em um dos casos, recebeu pena de 10 anos de prisão por invasão aos sistemas do Conselho Nacional de Justiça. A condenação de Zambelli pela Primeira Turma do STF se deu por unanimidade em maio.

Os ministros acataram os argumentos da Procuradoria-Geral da República (PGR) de que Zambelli atuou em parceria com o hacker Walter Delgatti Neto para inserir documentos falsos na base de dados do CNJ – incluindo um suposto mandado de prisão contra o ministro Alexandre de Moraes.
Na outra ação, foi condenada a 5 anos e 3 meses de prisão pela perseguição armada a um apoiador do presidente Lula, ocorrida na véspera do segundo turno das eleições presidenciais de 2022.
Segundo a PGR, a intenção era “colocar em dúvida a legitimidade da Justiça” e fomentar manifestações contra as instituições republicanas.
Em junho, a decisão foi mantida pela Primeira Turma – também por unanimidade – ao analisar os recursos apresentados pela parlamentar.
Além da prisão, o STF também determinou a perda imediata do mandato de Zambelli. A Constituição prevê a cassação de parlamentares condenados criminalmente e sem possibilidade de recurso.
A parlamentar fugiu para a Itália. Dias depois de ser considerada fugitiva e procurada pela Interpol, Zambelli foi presa nos arredores de Roma. O governo brasileiro pediu a extradição da deputada, que ainda não foi analisada pela justiça italiana.
Zambelli também foi condenada de forma definitiva pelo STF a 5 anos e 3 meses de prisão por porte ilegal de arma e constrangimento ilegal com emprego de arma de fogo em 2022.

Impasse Câmara x STF
O debate sobre a interpretação da Constituição pode ocorrer, por exemplo, a partir de uma ação que questione a validade do procedimento adotado pela Câmara ou por meio de pedidos feitos no próprio processo penal contra Carla Zambelli.
O líder do PT na Câmara, deputado Lindbergh (RJ), disse logo após a votação que o partido vai ingressar com um mandado de segurança no STF para questionar a decisão do plenário.
“A decisão do Supremo é uma decisão muito clara. (…) Não era para ter ido à CCJ, e o presidente Hugo Motta acabou criando um problema para si próprio. Não era para ter ido para o plenário”, disse.
A situação de aproxima do precedente criado pelo processo contra o então deputado federal Natan Donadon em 2013. À época, a evolução do tema no Congresso levantou a discussão sobre a perda de mandato de parlamentar alvo de processo penal.
Na ocasião, a Câmara também levou à deliberação do plenário a situação de Donadon, que teve o mandato preservado pelos colegas.
O tema, então, foi novamente parar no Supremo: um mandado de segurança do deputado Carlos Sampaio (PSD-SP) questionou a validade do processo legislativo adotado pelos parlamentares. Relator do caso, o ministro Luís Roberto Barroso suspendeu a decisão da Câmara.
Posteriormente, a Casa cassou o mandato de Donadon, mas por outro caminho: a partir de um procedimento aberto no Conselho de Ética. Em 2019, a pena de Donadon foi extinta por um indulto natalino do ex-presidente Michel Temer.
Entenda o que diz a Constituição
A Constituição prevê um conjunto de situações em que um parlamentar pode perder o mandato.
Entre elas, destacam-se duas situações:
- quando o político falta a mais de um terço das sessões da Casa Legislativa. Neste caso, a perda é automática, declarada pelo comando da Câmara ou do Senado.
- quando o político é alvo de condenação criminal definitiva. Neste caso, a perda do mandato é decidida pela Câmara ou o Senado, por maioria absoluta.
Quando decidiu pela condenação de Zambelli, a Primeira Turma do STF determinou a perda de mandato de forma automática, ou seja, com uma declaração da Mesa da Câmara.
Por que o colegiado do Supremo segue esta linha? A interpretação envolve o excesso de faltas. A deputada foi condenada a uma pena superior a 120 dias, em regime fechado, a ser cumprido na prisão. Ou seja, ela fica impedida de exercer suas atividades e, inevitavelmente, vai ultrapassar o limite de ausências. Por isso, a Turma entende que a perda de mandato é automática, adotando-se o procedimento da primeira situação.
Qual a posição seguida pela Câmara? Os deputados deram um tratamento diferente ao tema. Seguiram a segunda situação, aplicando a perda de mandato para parlamentar que sofre condenação penal. Ou seja, consideraram que é cabível uma análise do caso pelo plenário da Câmara, rebatendo a tese de que a perda seria automática.
Da Redação com informações de G1
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