O Ministério Público pode ajuizar ação civil pública para contestar honorários advocatícios abusivos quando houver pessoas vulneráveis prejudicadas e o caso transcender a esfera dos interesses particulares.
Com esse entendimento, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça negou provimento ao recurso especial de um escritório de advocacia que perdeu o direito de cobrar honorários superiores a 30% em causas previdenciárias.
O precedente gerou reação na advocacia. Dias depois do julgamento, a seccional cearense da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) enviou ao Conselho Federal da entidade um ofício solicitando atuação para que somente a OAB possa discutir o tema dos honorários.
“Os honorários são absolutamente individualizáveis e determináveis em um processo, não sendo possível seu tratamento como direitos difusos, coletivos ou individuais homogêneos”, afirmou Erinaldo Dantas, presidente da OAB-CE.
Litigância predatória
O caso julgado se insere no polêmico tema da litigância predatória da advocacia, que também está sendo enfrentado pelo STJ, na Corte Especial.
O escritório em questão se tornou alvo do MP porque, segundo o órgão, criou um esquema de captação e cobrança abusivas de serviços de idosos beneficiários da Previdência Social.
As diversas ações ajuizadas foram em favor de pessoas vulneráveis, em regra sobre benefícios rurais de pensão e aposentadoria, com previsão de pagamento aos advogados de valores superiores a 30% das verbas retroativas a receber.
O esquema contava também com participação da Câmara dos Vereadores local, já que os advogados eram indicados pelo presidente da casa legislativa e usavam suas instalações para se reunir com os potenciais clientes.
Ou seja, quem procurava um agente público acabava direcionado para advogados particulares. A instâncias ordinárias reconheceram o abuso e condenaram o escritório.
A decisão tornou sem efeito a cobrança de honorários nos contratos firmados com previsão de pagamento de mais de 30% dos valores retroativos dos benefícios dos clientes, anulou cláusulas abusivas e limitou a expedição de alvarás de levantamento de valores.
Ao STJ, o escritório alegou que seria impossível usar a ação civil pública para tratar de honorários advocatícios, já que são direitos individuais disponíveis e não existe relação de consumo entre cliente e advogado.
Crise na previdência
Relatora da matéria na 3ª Turma, a ministra Nancy Andrighi observou que o caso ultrapassa os limites da esfera individual de cada idoso, pois a advocacia predatória acaba atingindo o propósito da Previdência Social.
“Ao cobrar honorários que prejudicam a subsistência dos beneficiários, configura-se como ofensa ao próprio sistema previdenciário. Logo, atinge um bem jurídico de interesse de toda coletividade”, explicou ela.
Em sua análise, o tema também atrai a competência do Ministério Público porque envolve pessoas em situação de extrema vulnerabilidade que tiveram sua subsistência afetada.
“A hipossuficiência dos interessados que foram submetidos a cobranças de honorários advocatícios excessivos, por si só, já demandaria a atuação do Ministério Público”, disse a ministra Nancy. A votação foi unânime.
Com informações do Conjur