novembro 24, 2024 19:27

‘Há algo muito errado neste país’, diz juíza ao criticar recomendação do MP para não vacinar policiais

A juíza Joana Sarmento, da Vara de Execuções Penais de Boa Vista, criticou duramente nesta segunda-feira, 17, a recomendação do Ministério Público de Roraima (MPRR) para que policiais penais não sejam incluídos no grupo de agentes da Segurança Pública e tenham prioridade na vacinação contra a Covid-19.

Um dia antes da manifestação da juíza, o MPRR, por meio do promotor de Justiça Madson Wellington Batista Carvalho, recomendou ao secretário Estadual de Saúde, Airton Cascavel, que adiasse o cumprimento da decisão judicial, expedida por Joana Sarmento, até esta quarta-feira, 19, e pediu, ainda, no prazo máximo de 24 horas, informações sobre o cumprimento da recomendação.

De acordo com Carvalho, os policiais penais não integram o grupo de atuação direta de combate à pandemia e o uso de insumos para vaciná-los “implicará prejuízos à coletividade e alteração indevida do Plano Nacional de Imunização [PNI]”, deixando de lado pessoas pertencentes aos grupos prioritários estabelecidos por “norma legítima”.

O procurador argumenta, ainda, que ao Ministério Público cabe “a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis”.

Para ele, o PNI, integrante do Sistema Único de Saúde (SUS), é “um serviço perene e universal, de modo que qualquer determinação judicial que questione critério ou utilização, compete à Justiça Federal”. Ele acrescenta ainda que a decisão da juíza Joana Sarmento é “manifestamente ilegal”.

‘Espanto’

“Custa-me crer que um promotor de Justiça teria dado uma recomendação para que o secretário de Saúde descumprisse ordem judicial expressa”, afirma, por sua vez, a juíza, ressaltando, ainda, que lhe causa espanto o procurador do Estado requerer que seja reconsiderada uma decisão da Justiça com base em uma sugestão do MPRR. “Desculpe a franqueza, mas há algo de muito errado neste país”, destaca.

Joana Sarmento faz duras críticas ao MPRR e argumenta que a sua decisão sobre a vacinação dos policiais penais abordou a questão do ponto de vista técnico, pois, segundo ela, esses servidores fazem parte do grupo prioritário.

“A não inclusão [dos policiais no grupo prioritário] afronta o texto constitucional. Ao não incluí-los, houve uma preterição desarrazoada, pois não houve nenhuma justificativa estatal para excluí-los”, avalia a juíza.

Para ela, trata-se também de algo ilógico, uma vez que “o risco dos policiais penais é muito maior do que o dos demais policiais, já que trabalham em ambiente total de confinamento”.

“Não precisaria de determinação judicial se houvesse, por parte da Secretaria de Saúde, um pouco de bom senso que se espera do homem médio, que dirá de agente público”, acrescenta Joana Sarmento.

Recomendação x Ordem judicial

“Que aula esta magistrada faltou em que, ao que parece, um promotor de Justiça pretende impetrar um mandado de segurança e, para conseguir efeito suspensivo, se vale de uma recomendação que vai contra uma ordem judicial expressa? Em que aula de Português uma recomendação se sobrepõe à ordem? Que aula esta magistrada faltou em que se pretende o descumprimento de ordem judicial expressa com base em um mandado de segurança futuro a ser impetrado?”, questiona a juíza.

Na decisão desta segunda-feira, Joana Sarmento confirma a anterior e determina que os policiais penais sejam incluídos no grupo prioritário de vacinação, uma vez que, por ordem constitucional expressa, fazem parte da Segurança Pública.

“Não é demais ressaltar que é ordem judicial e não mera recomendação”, argumenta a juíza, destacando que uma cópia da decisão deve ser enviada à Corregedoria do Ministério Público “para ciência de que um promotor de Justiça está expedindo uma recomendação para descumprir ordem judicial expressa”.

 

Érico Veríssimo, para O Poder

Foto: Divulgação/Governo Federal

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